sexta-feira, 12 de abril de 2013

A NOIVINHA - 8 
MILTON  MACIEL

Final da parte 7 Mas, para facilitar para todos nós, peça a seu mano para não voltar em dia de segunda ou de terça-feira, que é quando o delegado fica por aqui. Em qualquer outro dia, Seu Bastião pode contar com a minha colaboração e a minha discrição. Assim é mais fácil.

– Pois o sargento é que divia di sê o delegado daqui.

– Mas eu sou, na prática. O doutorzinho moço deixa tudo nas minhas mãos, mesmo quando está aqui. Só que eu não tenho o diploma, sabe como é.

PARTE 8:
– Pois intão tá tudo bem assim. O sargento é um home moderno, compreende as coisa.

– Claro, claro. E Deus me livre de ter um dia qualquer problema com a sua família. Se alguma vez algum de vocês tiver que despachar uma encomenda aqui, me procurem antes, a gente se entende e dá um jeito de não ter que ficar, nunca, um contra o outro.

– Pois taí, sargento. O sinhô é um home decente! Vô falar pra painho, ele vai ficá muito do sastisfeito cum o sargento, ora se vai.

– Pois mais satisfeito fico eu de ter podido participar dessa missão conjunta das forças de vocês com as nossas. Mais uma vez eu quero dizer o quanto o município vai ficar agradecido a Dito Timbó e seus filhos. Ainda mais agora que eu fiquei sabendo que o Zé Bode vai despachar o amaldiçoado, isso vai ser uma maravilha para nós da polícia! Ficamos livres do pior problema que já tivemos por aqui.

Bem, tá tudo certo intão. Nóis já se vamo. O home ficô com um punhal, o sargento deve di tê visto. Acha qui é perigoso pro sargento e os praça? Acha qui o home podi tentá fazê argo pra fugi?

– Quem? O Zé Bode? Não, não tem perigo, não. O homem é dos nossos, sabe como é? Tá ali por pouco tempo, mais uns quatro meses e nós vamos soltar o dito cujo. O amigo deu sorte na escolha. Eu vou deixar a arma com ele mesmo, só vou mostrar que eu estou sabendo de tudo, do arranjo com os Timbós, tudo isso. Pode ir embora tranqüilo, tudo vai andar do jeito que vocês querem. O amigo falou baixo para os homens na cela não ouvirem, mas eu ouvi daqui, estava bem perto. Pode ir seguro de que, no dia certo da volta do Bastião, vão ficar aqui seis viúvos inconsoláveis – e sargento Elias não segurou a gargalhada.

   Despedindo-se do sargento, a milícia vingadora dos Timbós já poderia voltar para casa, com a consciência tranqüila do dever cumprido. Mas Osmar, Bastião e Jeremias estavam preocupados também com a menina, possível irmã deles. Queriam tirar a cisma, precisavam ver a criança. Pegaram as informações e foram em busca dela na estrada grande de asfalto, no posto de gasolina. 

Já Dito Timbó partiu em outra direção, para uma fazenda próxima, onde – haviam lhe garantido – Marta teria se refugiado com os outros filhos, depois de ter sido surrada e ameaçada de morte, mais uma vez, por João Boto.

   Com menos de duas horas de trote Timbó estava na porteira da fazenda. Indagou de Marta e lhe confirmaram que ela estava lá, mas que estava sob a proteção do dono da terra, que se alguém quisesse falar com ela, tinha que ser com autorização do homem.

   Dito não via a hora de botar os olhos em Marta outra vez.

MARTA

   O casal de trabalhadores que atendeu Timbó na porteira se prontificou a comunicar sua presença ao pessoal na casa grande. Coisa de uns quinze minutos depois chegaram dois homens a cavalo, armados, com caras de poucos amigos e interpelaram o visitante:

– Que qui ocê qué cum Marta, seu cabra? É di parte di João Boto? Si fô, pode vortá daí mesmo, qui o patrão num le dá permissão di entrá. 

   Dito Timbó tirou o chapéu e falou tranqüilo:

– Diga a seu patrão qui é da parte di mim mesmo, Dito Timbó.

   Ao ouvirem aquilo, os dois homens tiveram um instante de incredulidade e surpresa. Um deles tocou o animal até chegar mais perto do visitante e então deu um puxão no freio, fazendo o cavalo quase empinar:

– Vixe! Pois se é Seu Dito Timbó mesmo, Zacarias! Dito Timbó em pessoa! Anda, se mexe, abre essa portera já, seu molenga, num faz Seu Dito isperá! O senhor nos adiscurpe, Seu Dito, nós num sabia, nunca qui ia imaginá qui Dito Timbó em pessoa ia istá na nossa frente, em carne i osso!

– Tá certo! Num tem pobrema. Vamo intão até donde qui tá a Marta, to pricisado di um dedo di prosa cum ela – foi o que disse o matador, enquanto seu cavalo entrava na fazenda.

   Trotaram uns poucos minutos até a casa-sede, com os homens se desmanchando em desculpas e elogios a Dito Timbó, que gostou da prosa dos dois. Ao chegarem, Timbó reconheceu Marta de longe, sentada nos degraus da pequena escada de acesso à varanda, passando um pente nos cabelos de uma menina já crescida, sentada ao lado dela. A mulher encarou os três cavaleiros, arregalou os olhos e deixou cair o pente, com um grito:

– Dito!!! Benza Deus, você veio, homem! Deus é pai, você veio valer sua filha!

– Tardes, Marta. Mecê segue uma mulé bunita como só. Qué dizê qui essa minina qui o safado buliu cum ela é mesmo minha fia? Posso acreditá nisso?

– Ah, pode sim, Dito. Tanto é sua menina que eu nunca lhe incomodei por causa dela. Nunca lhe falei e nunca, nunquinha, quis saber de lhe pedir algo pra coitadinha. Quando você se foi e eu descobri que estava de barriga, eu quis ter a criança pra ficar com uma lembrança de você, uma lembrança boa na minha vida infeliz. Aí, quando nasceu e eu vi que era mulher, aí mesmo é que nem quis mandar lhe dizer nada, pois todos sabem que Dito Timbó não dá bola pra filha mulher. Mas agora, com a desgraça que aconteceu com a coitadinha, eu tive que lhe pedir socorro, você é mesmo o pai e só o pai ou irmão mais velho é que pode punir o agressor.

­– E mecê quer qui eu dê um corretivo no home qui fez isso?

– Foi como lhe escrevi. Você é que é o pai e a ela não tem mais ninguém no mundo que possa defender a coitadinha. Sabe, o homem que fez isso é muito ruim e muito perigoso.

– Pois si é um tar di João Boto, não é? I esse era o marido qui ocê tinha agora, não é?
CONTINUA

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