quinta-feira, 16 de maio de 2013


E AGORA TEMOS QUE MORRER
(O derradeiro canto de Leônidas)
MILTON MACIEL   (ver mapa abaixo)

Ó Górgo, amada Górgo,
Como sentirei tua ausência !
Têm mostrado os deuses comigo tão escassa clemência,
Pois nem bem oito anos fazem que eu, ao teu lado, acordo.

Ah, Górgo, Górgo adorada,
São findos os meus dias, doce amada.
O traidor Efíaltes nos trouxe Xerxes à retaguarda
E a resistência de Esparta... Termópilas não mais guarda!

Górgo adorada, minha esposa,
Como é triste afastar-me desta forma!
Deixar-te para sempre minha alma ainda não ousa,
Mas tudo está disposto e tudo em volta se transforma.

Hermes Psicopompos virá por minha alma
E a escoltará triste, até que ao Estige eu chegue.
Lá estará a barca de Caronte, em sua espera calma
E o irrecorrível trajeto farei, por mais que o negue.

Sarpedon e Radamanto, juízes terríveis,
Avaliarão, um por um, meus feitos mais incríveis.
Mas não me absolverão, pois fui rei e fui guerreiro;
E nem levarão em conta, aqui, meu feito derradeiro,
Quando dou minha vida por Esparta e seus traidores.
São assaz inclementes, esses irmãos de Minos, julgadores!

Górgo, esposa e mãe espartana,
Perdoa-me por largar-te à sorte madrasta, tirana.
Pois só a ti caberá educar nosso amado menino Plistarco,
Fazer dele um homem de caráter, que honre escudo e arco.
Faz-lhe compreender que um guerreiro espartano fará tudo
Para voltar a casa carregando – ou sendo carregado, morto, sobre o escudo.

Os estultos atenienses nos deixaram sós nesta empreitada,
Por mais que Temístocles os tenha, em vão, tentado despertar.
Por causa de seus jogos olímpicos, religiões, não quiseram fazer nada.
No entanto, transposta a Beócia, será justo a Ática que Xerxes irá arrasar.
Temístocles por Atenas, eu por Esparta, tivemos a correta percepção:
Somente em Termópilas, entre a Tessália e a Beócia, poderíamos resistir.
Mas até mesmo em Esparta havia também os jogos e feriados de religião.
Nem ele, nem eu logramos reunir um exército. Então tivemos nós que partir.
Os trezentos heróis de minha guarda pessoal foi toda a guarnição
Que me foi dado trazer para esta guerra. Trezentos bravos espartanos!
Mas, no caminho, corajosos téspios juntaram-se a nós. E mais tebanos.
Chegamos a Termópilas e já éramos um grupo que somava nove mil.
Da Tessália chegaram os persas. E Xerxes podia contar mais de cem mil!

Por cinco dias resistimos. Não importava que fossem muitos
Porque, certamente, ele não podiam lutar – e passar – todos juntos.
E nossos combatentes em muito os excediam em qualidade e valor.
E mais tempo teria o impasse durado, não fosse a ação de um traidor.
Elfíates, malfeitor, ensinou aos persas o contorno secreto. Nos entregou!
Xerxes e seus cem mil contornaram Termópilas e estão aqui agora.

Felizmente fiquei sabendo da traição a tempo e dispensei todos os soldados.
Só eu tinha o dever de ficar! Mas ficaram os bravos espartanos a meu lado.
E, para surpresa e encanto nosso, setecentos téspios e quatrocentos tebanos
Decidiram que morreriam conosco. Portanto, amada, não são só espartanos
Os heróis de Termópilas que tombaram pela Hélade – ensina-o, tu, ao povo:
Mil e quatrocentos somos os que as vidas damos.
E, se mais tivéssemos, mais daríamos de novo,
Pois esta é morte gloriosa de que nos orgulhamos.

E agora temos que morrer!
Tenho que partir já, minha amada,
Já as flechas dos persas escurecem todo o céu.
Melhor – disse aos meus homens – lutaremos na sombra!
Xerxes mandou-nos um ultimato: Entreguem as armas!
Mandei-lhe a única resposta possível: Então venham buscar!
E agora eles estão vindo, adorada.
Então chegou minha hora de lutar.
Serei o primeiro à frente dos meus bravos.
Parto desta vida feliz por que morro por Esparta
E infeliz porque perco para sempre tua presença amada
Agora eu marcho, sobranceiro e sem temor,
Seguem-me, heróicos, espartanos, téspios e tebanos.
Centenas de arcos, espadas e lanças se erguem ante meu peito
Eu avanço com um sorriso e estou feliz.
Porque, no derradeiro instante, neste lado da vida
É só você que eu vejo, minha Gorgo querida.
Não vejo mais persas ou espadas,
Só o rosto resplendente e lindo
De minha mulher amada.
Ó, Górgo, Górgo, Górgo! Como te amo...
Aaaahhhh!


 

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