segunda-feira, 20 de maio de 2013


UMA MUDANÇA DE PARADIGMA - 9  
Os sérios problemas que vieram 
com a Agricultura Série transcrita dos livros
"A SOPA QUÍMICA"/“THE CHEMICAL BROTH 
- Milton Maciel – Idel - 2008/2013 (Broth = Caldo)
(ver mapa abaixo: distribuição dos indígenas)

O Desequilíbrio Essencial (continuação)

   Mas todos os indígenas brasileiros aproveitavam qualquer tipo de animal na alimentação, incluindo mosquitos, piolhos, larvas, lagartas, gafanhotos, formigas, cupins e lagartixas, além dos óbvios macacos, antas, capivaras, porcos do mato, cobras, aves (e seus ovos) e muitos outros animais que caçavam. Os rios e lagos lhes proporcionavam fartos estoques de peixes, sapos, rãs, enguias e jacarés.

  Aqui no Brasil, como em qualquer outra parte do mundo, pode-se dizer que os seres humanos já comeram de todas as espécies de animais que se moveram sobre a Terra, após a existência do gênero Homo. Simplesmente todo e qualquer animal que teve o infortúnio de cruzar com os humanos em seu caminho, acabou em sua barriga, da larva ao elefante, do piolho à baleia.

   Os índios Tupis e Guaranis tinham uma dieta muito mais rica e variada. Comiam o mesmo tipo de carne de caça e pesca abundante, citado acima. Contudo, sendo habitantes da faixa litorânea, não só se alimentavam também de peixes de mar e mariscos, como também faziam uso moderado do sal, que sabiam extrair da água do mar. Como condimento, usavam vários tipos de pimentas nativas e certas ervas aromáticas.

  A dieta era extremamente rica numa ampla variedade de frutas silvestres, com especial destaque para o caju, a goiaba, o araçá, o ananás, a mangaba, a pitanga, o pequi, o cacau e o coco. Além dessas, de acordo com a região em que viviam, tinham a seu dispor um verdadeiro banquete de outras frutos: abiú, jambo, guariroba, grumixama, açaí, cupuaçu, guaraná, jaboticaba, gabiroba, camu-camu, carambola, guaraná, baru, jambolão, butiá, guabiju, licuri, jaracatiá, murici, pindaíba, murumuru, cagaita, sapoti, maracujá, pitanga, marajá, fruta-de-ema, banana-de-macaco, marôlo, araticum-cagão, taperebá, cariota-de-espinho, pau-alazão, para citar apenas algumas.

   Aliás, esta relação aqui apresentada é apenas uma pálida amostra das mais de trezentas diferentes espécies de frutas nativas do país. As matas ofereciam esse banquete permanente de enorme diversidade, algo inexistente nos dias de hoje, quando um reduzidíssimo número de frutas, boa parte não-nativas (em itálico), ocupa o nosso paupérrimo cardápio: banana, maçã, laranja, limão, goiaba, caju, coco, tangerinas, manga, morango, pêra, uva, pêssego, mamão, melão, melancia, abacate, maracujá, abacaxi e figo.

   Mas, apesar de serem cerca de duas dúzias as espécies de frutas mais comumente consumidas agora, dificilmente todas elas chegam a fazer parte do cardápio anual dos brasileiros. Vê-se, assim, que a perda de biodiversidade é extrema, quando comparamos as dietas primitivas com as contemporâneas.

   A banana passou a ter uma grande importância na alimentação indígena, por causa de sua rápida propagação pelo território brasileiro, mas a banana não é uma fruta nativa do Brasil, como o são todas as outras acima citadas, incluindo o  cacau, o que pode causar estranheza a algumas pessoas que acreditam, por exemplo, que o cacau originou-se apenas da América Central.

   Quanto à atividade agrícola propriamente dita, além do cultivo primitivo da mandioca, os indígenas mais aculturados plantavam também o milho, conhecido como abati entre as tribos litorâneas. Contudo, uma coisa chama a atenção: embora já com hábitos de agricultores, mesmo assim a maior parte das tribos ainda não tinha abandonado totalmente o costume nômade de seus ancestrais caçadores-coletores. Não se fixavam à terra por mais do que quatro anos, em média, abandonando um lugar sempre que viam diminuir ou a fertilidade do solo ou a disponibilidade de caça e pesca abundante e, portanto, extremamente fácil.
  
   Quando os colonizadores portugueses chegaram ao Brasil pela primeira vez, em 1500, havia provavelmente 5 milhões de índios no Brasil. Hoje, eles estão reduzidos a menos de 10% dessa quantidade original.  Nos primeiros tempos, apesar de muitas escaramuças, o convívio com os brancos foi relativamente pacífico, enquanto estes se preocuparam apenas com o extrativismo de pau-brasil. Mas, quando os portugueses começaram a introduzir suas lavouras, os índios passaram a ser vistos como entraves à posse da terra necessária aos cultivos, pois resistiam ao avanço dos agricultores. Também passaram a ser vistos como potencial mão-de-obra barata – ou seja, escravos para as lavouras.

   Mas os índios resistiram sempre, não se submeteram; eram guerreiros valentes e não sobreviviam se submetidos ao cativeiro nas roças. Ante o potencial bélico muito superior dos invasores, preferiram migrar do litoral para o interior, embrenhado-se nas selvas de difícil acesso aos colonizadores. Isso levou os colonizadores a buscar mão-de-obra escrava na África, iniciando-se assim o longo e doloroso processo de captura e transporte de centenas de milhares de africanos para o Brasil. Era a agricultura cobrando seu alto e permanente preço da escravização.
CONTINUA


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